REGIÃO: Conheça as Lendas da Bicha Pintada, Fonte Velha e Dos 7 Juízos
Todos os concelhos e lugares têm a sua história, misticismo ou lenda. Neste artigo decidimos dar a conhecer ao leitor três lendas (reais ou não) dos concelhos de Vila de Rei, Sardoal e Mação.
LENDA DA BICHA PINTADA - VILA DE REI
Ali para os lados do Penedo Furado, uma humilde pastora levou o seu rebanho até às férteis pastagens da ribeira de Codes. Enquanto as suas cabras pastavam docilmente, ouviu uma triste melodia que saía dos lábios de uma mulher.
Atraída pelo melancólico canto, a pastora viu uma bela moura que penteava os seus belos cabelos negros com um pente de ouro, enquanto observava o seu reflexo nas calmas e translúcidas águas da ribeira.
A moura deixava transparecer uma tristeza tão grande que a jovem pastora não teve medo e aproximou-se. A bela senhora, ao sentir-se observada, interrompeu abruptamente o canto e levantou-se de rompante, como que assustada.
A pastora conseguiu então vê-la melhor. Um longo vestido de fina seda cobria-lhe o corpo e as ricas jóias com que se enfeitava eram de tal modo resplandecentes que a cobiça reluziu no olhar da pastora. Sem sequer se aperceber, estendeu a mão como que a pedir o pente de ouro. A mulher sorriu e, numa voz suave, disse que lhe dava o pente de ouro e até um bezerro de ouro escondido ao pé do penedo furado, mas apenas com uma condição: que a ajudasse a quebrar o encanto que lhe fizeram e que a obrigava a uma imortalidade triste e solitária.
Para ficar na posse dessa imensa riqueza, a pastora apenas teria de permitir que lhe beijasse o céu-da-boca e de converter-se à fé da moura.
A pastora olhou para o vestido de seda e para as ricas jóias da moura, viu-se a si própria andrajosa e descalça, e imaginou-se também ela ricamente vestida. Tinha um aspeto tão triste e era tão bela a moura encantada que não lhe metia medo. E o receio de se fazer beijar pela mulher e converter-se à fé mourisca era bem menor do que a cobiça que o ouro resplandecente lhe despertava.
A jovem pastora acenou com a cabeça, concordando, e a bela moura aproximou-se languidamente e já estava a apenas uns centímetros da pastora. De repente, como que por artes mágicas, a bela moura transforma-se numa enorme serpente que se empina e estica a cabeça em direção à boca aberta de estupefacção da jovem pastora.
Tomada de pânico, a jovem dá um salto para trás e benze-se. Quando viu à sua frente o sinal da cruz, a horrenda serpente estacou e silvou de raiva, batendo em retirada e rastejando pela pedra até se meter num buraco onde não mais foi encontrada.
Quando a pastora chegou numa aflição à aldeia, os homens juntaram-se para fazer uma batida à serpente, mas do enorme bicho peçonhento nem sinal. Apenas a sua fuga ficou para sempre marcada na pedra.
LENDA DA FONTE VELHA - SARDOAL
Diz a lenda que no fundo da fonte existiam duas lajes, cada uma com uma argola de ferro que permitia levantá-las e que quando a água estava límpida e sem lodo, se podiam ver.
Essas lajes tapavam dois compartimentos onde estavam metidos dois cofres. Um guardava ouro e o outro guardava a peste, sem que se soubesse sem os abrir, o que cada um guardava. Porque isto se passava no tempo em que a peste era a doença mais temida pelo povo e em que sempre que grassava a peste morriam muitas pessoas, nunca ninguém teve coragem para levantar as lajes e abrir os cofres.
Mas um dia, diz a lenda, um rapaz pobre do Sardoal apaixonou-se por uma rapariga muito bonita, filha de pais muito ricos que não permitiam o seu casamento com alguém que não tivesse, dinheiro e fazendas, à altura da sua fortuna.
Sabendo do ouro que estava guardado na Fonte Velha, numa noite de Verão em que estava quase seca, o rapaz desceu ao fundo da fonte e destapou a laje onde se guardava a peste e abrindo o cofre viu que estava vazio. Logo depois tira a laje do outro compartimento e tira o cofre do ouro que traz consigo.
A lenda não nos diz se ele casou ou não com a rapariga de que gostava. O que nos diz é que a partir desse dia, o Sardoal que até aí sempre vivera sem a peste e em que todos os habitantes eram amigos e viviam felizes, passou a ser um inferno de doenças, zangas e zaragatas.
Quando o povo soube que o tal rapaz tinha tirado o cofre do ouro da Fonte Velha, obrigou-o, pela força, a pôr lá o tesouro de novo, voltando a colocar a laje no seu sítio, e a paz voltou ao Sardoal, não voltando a haver peste.
É que a água era a principal riqueza que havia e há na Fonte Velha, essencial para a vida de todos e a pior peste é a ambição desmedida, a inveja, a avareza e a discórdia. As lajes da Fonte Velha, diz a lenda, ainda lá estão, esperando-se que não voltem a ser mexidas.
LENDA DOS 7 JUÍZOS - MAÇÃO
Reza a lenda que há muitos, muitos anos vivia ali para os lados do Vidigal, lugar próximo do Poço das Talhas, um discreto casal de mouros. Certa noite, entrando a moura em trabalho de parto, veio o marido pedir ajuda à parteira de Queixoperra.
A mulher desceu a aldeia e meteu-se a caminho da Cova da Moura, trouxe o bebé ao mundo e recebeu do casal uma oferta pelo auxílio prestado, tendo sido advertida para só abrir o bolso do avental – onde a oferta fora depositada – em casa.
Incapaz de conter a curiosidade, a mulher espreitou para dentro do bolso no caminho de regresso e nele viu apenas um punhado de carvão, que, desiludida, deitou fora. Já na aldeia, ao tirar o avental viu cair de dentro do bolso várias pepitas de ouro – e nesse momento percebeu o conselho do homem: o carvão transformara-se em ouro!
A parteira voltou então atrás na esperança de recuperar o carvão deitado fora ao longo do caminho, mas nada encontrou. Apesar de ser noite cerrada, decidiu ainda assim regressar à Cova da Moura, explicar o sucedido e lamentar não ter cumprido as ordens que recebera. O casal de mouros, no entanto, não acedeu ao pedido da mulher no sentido de a compensar pela sua insensatez, mas concedeu-lhe, para que daí em diante fosse mais atinada, sete juízos. E porquê sete? Ninguém sabe.
O que todos sabem é que é esta a lenda que dá fama aos habitantes de Queixoperra de serem gente com os cinco alqueires bem medidos.
Assim vos deixamos com uma boa tarde de leitura destas que são algumas das lendas de Portugal e da zona centro.