ARTIGO DE OPINIÃO: "Revolução do 25 de Abril - Será que valeu a pena?", por Francisco António
Se nos dias de hoje, por algum motivo, me for
formulada esta pergunta, direi claramente, e sem vacilar, que o golpe Militar
de 25 de Abril de 1974, em minha opinião valeu mesmo a pena.
- E porquê; Dirão muitos.
Pois bem, como tenho uma visão muito própria
sobre o assunto, apraz-me dizer o seguinte:
Em Abril de 1974, era eu um jovem empregado de
escritório, apenas com 19 anos de idade, mas que tinha já passado por alguns
episódios de vida que ainda hoje norteiam muitos dos meus procedimentos. Uma
infância difícil, sem fome é certo, mas com muitas carências, que hoje são
sobejos para muitos dos jovens do presente.
No início dos anos 70, já se fazia a “semana
inglesa” (oito horas por dia, e Sábado até ás 13 horas) e, pouco depois,
chegaram as 40 horas de trabalho.
A Segurança Social foi alargada para
trabalhadores rurais e criadas de servir, entre outros, pese embora não fosse
uma obrigatoriedade.
A escolaridade já era obrigatória há muitos
anos, mas existiam muitos condicionantes que não permitiam à grande maioria dos
jovens ir para além da 4ª Classe, nomeadamente incapacidade financeira dos
pais, falta de transportes públicos e estabelecimentos de ensino a longa
distância das aldeias. Restava, então, seguir uma qualquer profissão que
garantisse, de alguma forma, o futuro mediante as capacidades e aptidões de
cada um. Trabalho havia muito mas, mesmo assim, alguns emigravam,
principalmente os profissionais na área da construção civil.
Em 1971, já eu era um trabalhador
sindicalizado, embora nem se soubesse ao certo da utilidade do sindicato e já
existia fiscalização ás condições de trabalho, com particular incidência aos
menores que não podiam trabalhar nas empresas antes dos 14 anos.
Mas havia, entre outros grandes problemas
sociais, principalmente para os homens, o espectro da Guerra Colonial e, o
consequente serviço militar obrigatório. Era um entrave muito complicado na
orientação de um futuro enquanto esta fase não era ultrapassada. Alguns optavam
por sair do País, fugindo ao serviço militar, mesmo que isso trouxesse muitas e
graves consequências, já que depois só poderiam voltar ao País a partir dos 45
anos de idade. Os que ficavam, tal como eu, sentíamo-nos na pele de uma espécie
de heróis que, com o espírito patriótico de defender a Pátria, aguardávamos
expectantes a nossa vez de embarcar, mesmo sem saber ao certo para onde íamos e
ao que íamos.
Claro que a minha vez já não chegou, e isto
porque, entretanto, aconteceu a revolução de Abril de 1974. Cumpri o meu
serviço militar durante 22 meses no meu País, e já não embarquei. Isto porque,
entretanto, tinha começado o desenvolvimento, não muito bem conseguido é certo,
dos processos de independência das províncias Ultramarinas e o envio de
militares foi gradualmente reduzido até, finalmente, terminar.
Mesmo que fosse só por isto, e que já foi nada
pouco, direi claramente que a revolução de Abril de 1974, VALEU MESMO A PENA.
Mas, logo no dia seguinte ao 25 de Abril, os
militares desentenderam-se o que deu caminho livre a uma autentica anarquia. A
revolução estendeu-se pelas ruas, pelas empresas e pelos campos. O Verão Quente
de 1975 e o PREC - Processo Revolucionário em Curso - mudava o país, e o
dia-a-dia tornava-se cada vez mais turbulento.
Menos de um ano após a revolução de 25 de Abril
de 1974 o país assistia à nacionalização de diversos sectores, nomeadamente da
banca e da indústria pesada. Os operários expulsavam das empresas patrões e
gestores.
Nos campos os terrenos e as herdades eram
ocupados pelos camponeses mas, na maioria dos casos, liderados por gente que
acabou por usufruir dos dividendos dessas ocupações.
Assistiu-se a confrontos entre defensores das
políticas revolucionárias e eleitorais e correu-se aqui um sério risco da sociedade portuguesa, que acabava de se ver livre do jugo
totalitário de extrema-direita, caminhar para uma ditadura de extrema-esquerda,
talvez mais destruidora e até sanguinária.
Para isto, tenho com toda a sinceridade, e em
consciência, dizer que o 25 de Abril NÃO VALEU A PENA.
Um novo golpe de inspiração revolucionária, vem
então a verificar-se em 25 de Novembro de 1975, e que clarificou o cenário
político e abriu caminho para a realização de eleições realmente
democráticas que, em 1976, deram maioria aos partidos com politicas mais
moderadas. Foi este golpe de 25 de Novembro que permitiu que o 25 de Abril de
1974 não tivesse sido um falhanço.
Terminada, assim, uma guerra colonial com
soldados no terreno, e demasiado cara e sangrenta, deixamos também de ser o império que combatia povos que lutavam pela
liberdade;
Depois
do 25 de Abril de 1974, mais concretamente depois do 25 de Novembro de 1975,
passou a ser possível a liberdade de expressão,
de reunião, e de associação;
Antes
do 25 de Abril de 1974 não havia propriamente eleições, e se haviam, os
eleitores eram previamente escolhidos, e a maioria do povo nem tinha direito a
voto;
A
partir de 25 de Abril de 1974, deixaram de haver presos políticos, e passou a
ser aceite e respeitada a ideologia política de cada um;
Antes
do 25 de Abril de 1974 não havia acesso à saúde, à educação, e às reformas,
pelo menos nos privados, e as pessoas não podiam sequer protestar.
Depois foi criado um Serviço Nacional de Saúde
acessível a todos, pese embora, com o passar dos tempos, tenha sofrido muitas e
ruinosas alterações;
Foram
criadas condições para uma melhor, mais abrangente e mais eficiente educação,
disponível para todos os jovens. A qualidade de vida do povo melhorou
consideravelmente, muito embora, ultimamente, se tenha vindo a verificar uma
degradação, no contexto da sociedade portuguesa;
Depois veio a opção europeia por Portugal e pelos portugueses.
Podíamos enumerar muitos erros cometidos nesta caminhada, rumo à União
Europeia, e mesmo depois dela fazer-mos parte. Mas seria uma injustiça e até
demagógico negar os êxitos alcançados, por Portugal e pelos portugueses, com a
adesão à CEE. Bem, por tudo isto, continuo a poder voltar a afirmar
que o 25 de Abril VALEU A PENA.
Depois vieram as bancarrotas, a falência dos
bancos e a incapacidade governativa demonstrada por alguns governantes. Os cravos, símbolos de uma
revolução, aos poucos foram-se tornando em espinhos. Têm
proliferado, ao longo dos anos, arautos defensores de nada que vá para além dos
seus próprios interesses. Governantes, administradores e gestores públicos
corruptos, vivem impunemente à custa das migalhas, que seriam o sustento do
povo, enquanto a Justiça, vergonhosamente, vai “assobiando para o lado”, também ela refém do poder.
Para isto, meus amigos, é com muita pena minha que digo que o 25 de
Abril, se calhar, NÃO VALEU A PENA.
Mas a LIBERDADE conquistada em Abril de 1974, e miseravelmente escamoteada por muitos, ao longo destes 45 anos já passados, tem agora, mais do que nunca, de ser defendida e preservada com um maior cuidado.
Cabe ao povo, de uma vez por
todas, DIZER DE SUA JUSTIÇA e acredito que a memória do povo vai deixar de ser
fraca.
Aí,
eu poderei voltar a dizer que o 25 de Abril VALEU MESMO A PENA. Mas valeu realmente a pena, se não for apenas mais uma
data histórica do passado, mas que os seus verdadeiros ideais estejam no
presente e venham a ser o futuro.
Agora, mais do que nunca, o 25 de
Abril de 1974, terá de ser "TODOS OS DIAS".